— O que te falta Arlequim?
Finalmente, com a plateia completa o espetáculo tende a seu ápice de beleza. Tende... mas ainda não o alcançou. Certo é que a plateia de um espetador só está de fato completa.
— Se
não te falta, o que se passa Arlequim?
O
espetáculo que antes se dava coberto por retalhos coloridos, agora é projetado
violentamente em estilhaços de um espelho. Cada fragmento de losangos
imperfeitos me penetra a carne, reveste minha pele de reflexos e sangue. Cada
gota em seu vermelho vivo reproduz o que o espelho, agora sem unidade, revela:
minha realidade invertida.
A
iluminação é montada na esperança de que como o sol alcança a lua e esta o
reflete, também o público alcance os fragmentos de espelho e estes ao serem iluminados
devolvam a luz como reflexo ao espectador.
Agora a
hesitação toma conta do teatro, o espelho com toda sua pureza e sinceridade
expõe o ser sem máscara, palco e plateia se enchem de medo ao conhecer a si
próprios, mas a alma dos dois anseia avidamente por se ver refletir no espelho
sem mancha, nesse que é o outro. Na confusão que se instaura, o que reflete e o
refletido é palco e plateia, plateia e palco. Nessa via de reflexo duplo a verdade
se faz personagem no palco.
—
Arlequim?
(Silêncio
no palco)
— Não
desfaleça Arlequim, inscreva no ar tuas poéticas acrobacias, ainda que te cause
dor, inscreva as. A plateia de um espectador só já está completa, logo o
espelho côncavo se reconstituirá e comunicará o calor dos raios aos corpos no
teatro. E então, tu arlequim e tua plateia se abrasarão num aconchego sublime
— Arlequim?
Risos e Guizos!
— Arlequim?
Risos e Guizos!
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